Continuando a falar das histórias do menino Luiz Francfort, voltemos em que ele e minha mãe viram pela primeira vez a televisão. O próprio deu-me uma complementação do fato, já que na coluna “Genealogia da Comunicação” estas não foram citadas. Bem… estas o que? Ahá! Agora vocês saberão mais sobre aquela transmissão na Padaria Tupinambá – localizada na Rua Manduri, Itaim Bibi.
Em frente à padaria…
Julio, Adélia e os dois filhos Luiz e Alzira, junto a uma grande multidão, estavam defronte a Padaria Tupinambá contemplando a novidade que vinha dos “States”, a televisão. Era 1951.
Luiz assistia, deslumbrado com aquelas imagens, a uma animação bem feita, porém de difícil entendimento – era o desenho “Pica-pau”, ou como na época era chamado “Woody Woodpecker”. Isto porque os primeiros desenhos não possuíam dublagem e eram passados na íntegra os originais, vindos da América. O único que ele se lembra, que inicialmente havia sido traduzido, era Leôncio, aquela foca inimiga do Pica-pau. Esse, por sua vez, era traduzido por um português de Portugal. A primeira fala que o menino Luiz ouviu Leôncio pronunciar em português, foi:
– “Vou te pegar!!!” – que na dicção portuguesa saiu mais ou menos algo do tipo “Bôu dí begáire!!!”
Logo após, viria o comercial, em slides, dos “Colírios Moura Brasil”, que ficavam sem animação nenhuma, por volta de cinco minutos colado na tela! Era uma canseira, que na época era tido como o normal. Mas o tempo foi aproveitado pelos comentários entre a multidão.
Sobre aquela programação da PRF-3 TV Tupy-Difusora, podemos dizer que ainda era muito improvisada. Estavam numa fase ainda pioneira e que, baseando-se nestes testes, moldariam depois os primeiros passos do que hoje é a nossa televisão.
A atração seguinte ao longo slide do “Moura Brasil” seria “Imagens do Dia”, apresentado por Ribeiro Filho, que respectivamente foram o primeiro telejornal e o primeiro repórter do Brasil e da América Latina. Pois, a televisão brasileira foi a quarta televisão do mundo, sendo que, no continente americano ela tenha sido, oficialmente, a segunda depois do pioneirismo dos Estados Unidos.
Voltando ao fato lembremos que após o término da transmissão, Luiz começou a criar em sua cabeça a idéia de que queria trabalhar na tal televisão.
A primeira tentativa
Passado os anos, o menino Luiz havia crescido e não usava mais calças curtas, pois já havia entrado na mocidade. E em 1952 resolveu ir atrás do seu sonho… Foi até o Sumaré e entrou pelo portão da PRF-3 TV Tupi (agora escrita com “i”), na esquina da Avenida Professor Alfonso Bovero com a Rua Piracicaba.
Passou devagar pelo telhadinho que ficava entre o jardim e o “Palácio do Rádio”, um imenso casarão onde alojaram a televisão. Entrou dentro do “Palácio”, passou perto de umas cortinas vermelhas – era a entrada do auditório da PRG-2 Rádio Tupi e da TV – e começou a andar pelo grande corredor que dividia os estúdios e os departamentos da emissora.
Na entrada disseram-lhe para procurar o Jean, que cuidava dos recursos humanos e contratações da PRF-3 TV. Ficava ali, bem perto do bar da emissora (que atendia pelo nome de “Bar do Índio”, que fazia concorrência direta a famosa Panificadora Real, na outra esquina da Alfonso Bovero com a Av. Doutor Arnaldo).
Entrou na sala do tal Jean, que possuía um carregado sotaque francês em meio às palavras portuguesas que falava ao garoto.
– O que você sabe fazer? – Luiz começava a responder o questionário, dizendo-lhe que nada sabia. Pela face e pelo jeito de Jean, sabia que de lá nada sairia facilmente para ele, mas que o francês, por profissionalismo e para não mostrar descaso com o sonho do garoto, continuava a preencher aquela ficha, mesmo que soubessem que o futuro daquele papel seria um arquivo de vagas. Mas o empenho que Luiz demonstrava, foi encerrado por um “até logo” de Jean e uma imensa vontade de querer acreditar no pensamento de “quem sabe um dia eu trabalhe aqui”. O garoto saiu desanimado de lá.
“A Imagem Perfeita e o Melhor Som”
BanespaEm 1952 também, nascia pequeníssima a segunda emissora de São Paulo e a terceira do Brasil, a Televisão Paulista S/A, canal 5, propriedade do deputado Ortiz Monteiro. A emissora tinha seus estúdios em um pequeno edifício na Rua da Consolação, o Edif. Liége, que até hoje existe naquela esquina com a Avenida Paulista.
Conforme me disse o locutor esportivo Silvio Luiz – que começou na Paulista como ator de teleteatros – o slogan da emissora era “A Imagem Perfeita e o Melhor Som” devido a localização da antena em cima do Edifício Liége. A explicação está no fato de que a capacitação dos sinais era mais perfeita que a da Tupi, que gerava os sinais do Sumaré para a antena da emissora, no Edifício Altino Arantes, sede do Banco do Estado de São Paulo (atual Banespa), que só de lá passava os sinais para as casas das pessoas. Que trabalheira, hein! Portanto, a nitidez da TV Paulista era a grande diferença.
E o sucesso da emissora de Ortiz Monteiro veio a reiluminar as idéias daquele garoto. Em sua cabeça preferia a Tupi, por ser a grande emissora da época ( o que hoje é a Globo para todos nós ), mas aí repensou o seu sonho e viu que sua vontade não era bem trabalhar na Tupi, em si, mas sim no meio televisivo. E a idéia foi a de procurar da Televisão Paulista, em 1953.
Chegou no canal 5 e preencheu uma ficha com o profissional Plínio, que logo pediu que ele falasse com o diretor da TV, Roberto Corte Real. Roberto disse ao garoto que ele podia já começar, trabalhando de auxiliar da projeção na emissora.E por um ano Luiz Francfort ficou trabalhando na TV Paulista, começando sua carreira como radialista, já registrado, na projeção de slides de comerciais, vinhetas da emissora e carretéis de filmes. Há outras histórias do canal 5 que deverão ser assunto para depois (até mesmo sobre o futuro da Paulista, sobre Victor Costa e a transformação em TV Globo), pois agora falaremos da conquista do grande sonho daquele garoto de 14 anos.
Os peitinhos da menina
Na TV Tupi e nas demais emissoras, inicialmente, criou-se as garotas-propaganda, para não deixar o telespectador assistindo sempre aos cansativos slides. A Paulista tinha as suas, a Record também e por aí vai… Belíssimas garotas apresentavam os produtos que bancavam os programas das emissoras e falavam diretamente com o telespectador, como se fossem donas-de-casa habituais. Também será assunto de outra coluna as história das garotas-propaganda. Mas deixo claro, que não citarei o nome de uma determinada propaganda devido ao fato que logo vocês saberão. O intuito desta coluna não é difamar, nem causar danos morais a ninguém, muito menos à pessoas que tiveram uma vida de sucessos e que não devem ser denegridas no sentido que aqui falarei. Não é uma espécie de censura, mas sim uma forma de respeito. Porque aqui a televisão é vista de forma séria. Logo entenderam o por quê desta introdução.
Mas indo direto ao fato, na casa da Indaiatuba – aqui no Itaim – Luiz atendeu a um telefonema urgente (lembra-se até hoje que chegava perto da cozinha quando tocou o telefone, que ficava entre a essa, a copa e o corredor da nossa casa). Adivinhem quem era…O Jean!
O francês estava atônito, Luiz mal entendeu o por quê, já que só uma vez havia o encontrado. Mas Jean pediu que ele comparece-se urgentemente na emissora… Luiz nem teve tempo de dizer algo. Desligou o telefone e seguiu para a TV Tupi.
Chegado à TV Tupi, Jean, nervoso e irritado disse ao garoto que estava o contratando para a projeção, porque, como disse o francês:”
– Um moleque imbecil teve a audácia de pegar nos peitinhos da “menina”! Tivemos que botá-lo na rua… E precisamos de outra pessoa para cuidar da projeção!”
Acreditam que o garoto apertou os seios da tal garota-propaganda naquele “famoso” corredor da Tupi, que Luiz já havia passado naquele lamentável dia de 1952… Quem diria que a sua vida seria resolvida por causa de uma safadeza de um garoto? Pois é! Luiz, desta forma, entrava para a projeção da PRF-3 TV.
Sobre o garoto, Luiz até chegou a conhecê-lo, quando este foi pegar seus honorários e se despedir da TV, indo pela última vez na sala de projeção que trabalhava e viu, Luiz, já no seu lugar trabalhando. Infelizmente, para o garoto aquele ato audacioso foi fatal. Já, no caso de Luiz Francfort, já era outra história. Porque assim começava a grandiosa carreira deste radialista, daquele garoto, um pioneiro por detrás das câmeras.
Artigo publicado originalmente no portal Sampa On Line – coluna “Comunicação”, de Elmo Francfort, em 02 de março de 2001 – http://www.sampaonline.com.br/colunas/elmo/coluna2001mar02.htm